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Dr. Breno Gusmão fala sobre linfoma no jornal O Dia
Especialista explicou o que é o linfoma não-Hodgkin, tipo de câncer que o cantor Jorge Aragão enfrenta
Rio – Recentemente o cantor Jorge Aragão, de 74 anos, foi diagnosticado com linfoma não-Hodgkin, um tipo de câncer hematológico do sistema linfático. Para explicar o que é a doença, detalhar os sintomas e os tratamentos, o DIA ouviu a opinião de especialistas, que destacam a importância do diagnóstico precoce.
Em entrevista ao “Fantástico”, no último dia 13, Jorge Aragão revelou que sentiu muito medo quando recebeu o diagnóstico. “Minha cabeça não conseguiu, até hoje, assimilar tudo. [De repente] você está com um Linfoma não-Hodgkin, palavras que eu nunca ouvi falar. Pavor, medo”. O cantor contou que foi internado em um dia e no outro já fora diagnosticado.
Os linfomas são os cânceres que têm origem nos linfócitos, principais células do corpo humano responsáveis pela defesa, que nascem na medula óssea e fazem parte do sistema linfático, encarregado pela proteção do organismo contra infecções e algumas outras doenças. Suas principais estruturas são os linfonodos, ou gânglios linfáticos, pequenas formações que funcionam como filtros estrategicamente distribuídos por todo o corpo, local de residência principal dos linfócitos.
“O linfoma é quando um linfócito, que adquire um defeito no seu material genético, passa a produzir células filhas que herdam o mesmo defeito, formando então um clone de células anormais. É um clone que não que não sofre a regulação dos mecanismos gerais do nosso organismo, elas vão se reproduzindo sem um controle. Esse clone de células, crescendo em algum desses gânglios, aumenta o tamanho do gânglio. O termo técnico que a gente usa para isso é adenomegalia”, explica Jorge Vaz Pinto Neto, hematologista e diretor da Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular (ABHH).
Os linfomas são um grupo de doenças que possui mais de 40 tipos e classificações. Entre os mais comuns estão os de Hodgkin e os não-Hodgkin. Eles levam este nome por causa de Thomas Hodgkin, pesquisador que descobriu a doença no início do século XIX. Embora não tenham muita diferença nos sintomas, os linfomas de Hodgkin e não-Hodgkin apresentam algumas peculiaridades.
“Apesar de algumas semelhanças, eles se comportam de forma diferente. A única coisa que eles têm em comum é que podem se manifestar com tumorações relativamente nos mesmos locais, no pescoço, virilha, dentro do abdômen, acometendo a mesma estrutura, ou seja, os gânglios linfáticos, mas, quando é olhado no microscópio, a doença é bem diferente”, aponta Ricardo Bigni, hematologista do Instituto Nacional de Câncer José de Alencar (Inca).
Além desta divisão, dentro da categoria dos linfomas não-Hodgkin, há também uma subdivisão baseada na agressividade do câncer, os indolentes e os difusos de grandes células B. No primeiro, há um crescimento lento e brando da doença, já o segundo é mais agressivo e seus sintomas aparecem repentinamente. No entanto, embora sejam mais agressivos, os linfomas difusos de grandes células são mais tratáveis e apresentam uma chance de cura em 75% dos casos.
“Os linfomas indolentes, são os que vem com é menor agressividade, são mais brandos. Às vezes ele é achado e diagnosticado por outros motivos, e nem sempre precisa o tratamento. O linfoma indolente, em algumas ocasiões, é manejado só com observação e quando obedece a critérios internacionais que se inicia tratamento. Já os linfomas difusos de grandes células, que são mais frequentes, são os mais agressivos.
Normalmente, os pacientes já chegam apresentando os sintomas e obrigatoriamente começam o tratamento desde o início”, explica Breno Gusmão, onco-hematologista do comitê médico da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale).
Entre os sintomas mais comuns do linfoma não-Hodgkin estão o aumento dos gânglios linfáticos, mais conhecido como ínguas, em um lugar específico ou em vários diferentes, febre e sudorese noturna, perda de peso repentina e cansaço, em casos de anemia associada.
“A febre do paciente com linfoma é muito característica, de ocorrência no final da tarde ou durante a noite. Em geral, atinge níveis altos de temperatura, de 38°, 39° até 40°. É comum que o paciente nem perceba que está com febre, só a pessoa que está próxima dele que percebe esse aumento de temperatura. Ela se associa também com uma sudorese muito intensa dessas onde a pessoa molha a roupa e roupa de cama, de ter que levantar e trocar as roupas”, ressalta Jorge Vaz.
Embora não exista uma causa definida para o linfoma não-Hodgkin, especialistas observam que pacientes que foram expostos a alguns tipos de vírus e bactérias estão mais suscetíveis a desenvolver linfomas. Neste tipo de câncer, a hereditariedade não é um fator a ser considerado.
“Não existe uma causa concreta para que seja motivo de prevenção, por exemplo, como pode-se associação do cigarro, com o câncer de pulmão. Mas alguns vírus e bactérias podem estar relacionados à formação de linfomas. Por exemplo, pessoas que têm uma bactéria chamada helicobacter pylori [conhecida também como H-pylori] podem apresentar linfomas no estômago. O vírus HIV também está associado, também é um agente causador de linfomas. Mas isto nem sempre está relacionado, pode ser apenas uma mutação, independentemente de ter ou não o vírus ou a bactéria”, destaca Breno Gusmão.
Por não haver uma causa concreta, não existem maneiras de prevenir os linfomas. Ricardo Bigni, do Inca, diz que “a melhor forma de controlar o linfoma, como política de saúde, é a população ter acesso a um diagnóstico precoce. Se o paciente tem uma suspeita clínica, que possa rapidamente ser levado a assistência especializada e faça os exames mais rapidamente. Quanto mais precoce, maior probabilidade de sucesso do tratamento, eventualmente até mesmo de cura”.
Jorge Vaz, da ABHH, explica como é feito o diagnóstico do linfoma e ressalta a importância do médico patologista: “A biopsia do tecido acometido é imprescindível. É coletado um fragmento desse tecido, que vai ser encaminhado para o patologista, que fará uma análise inicial, por um método que a gente chama histologia. Posteriormente, ele fará um teste, que se chama imuno-histoquímica, onde, através dessas duas bases, ele vai conseguir estabelecer o nome e o sobrenome da doença. Só aí é possível diferenciar linfoma difuso de grandes células, linfoma indolente, linfoma de Hodgkin, linfoma não-Hodgkin, linfoma de Burkitt, entre outros”.
O médico Breno Gusmão, da Abrale, relata que, após o resultado da biópsia, o paciente é submetido a um exame de imagem para completar o diagnóstico: “Uma vez que temos o diagnóstico do linfoma, faremos um estudo de estágio, um estadiamento do linfoma através de exames de imagem, uma tomografia que faz rastreamento do corpo inteiro para saber quais são as regiões acometidas pela doença”.
Uma vez que o paciente é diagnosticado com linfoma, dependendo do tipo, dá-se início ao tratamento ou não. Para os casos em que a doença cresce de maneira lenta, os indolentes, é analisado se a pessoa precisará ou não de um tratamento, já que, por serem mais brandos, são menos sensíveis à quimioterapia. Já nos casos dos linfomas agressivos, os difusos de grandes células, a quimioterapia, associada a imunoterapia, é iniciada imediatamente.
“O tratamento passa, na maioria dos casos, por quimio-imunoterapia, ou seja, a quimioterapia convencional somada a imunoterapia, que são anticorpos que identificam as células específicas da doença para fazer um ataque direcionado às células doentes. A somatória das duas formas é a base do tratamento do linfoma não-Hodgkin”, descreve Breno Gusmão.
Assim que foi internado e recebeu o diagnóstico, Aragão já deu início ao tratamento. O cantor respondeu muito bem às medicações e, durante a entrevista ao ‘Fantástico’, revelou que já passou por dois ciclos de quimioterapia.
Devido ao tratamento, o sambista já perdeu os cabelos e contou que a barba está caindo. “Toda mudança que eu estou tendo e vou ter, cabelo cindo todo e barba que já está caindo. Eu não conheço o Jorge sem barba. Esse sou eu. É um renascimento”, desabafou o artista, ao “Fantástico”.
Sem deixar a música de lado, o artista, que cantava a todo momento enquanto estava internado, foi liberado e aconselhado pelos médicos a continuar fazendo shows. Aragão, que chegou a pausar sua agenda, já retornou aos palcos em um show emocionante em Madureira, Zona Norte do Rio.
Explicando a sensação que sentiu ao subir no palco pela primeira vez após o diagnóstico, Aragão revelou, ainda, à Globo: “A gritaria que eu ouvia, aquela energia que subia. O pessoal ficou muito tempo gritando. [Me senti] numa cama de orações e de energias boas muito fortes para mim. Eu estou vivo”.
De acordo com os médicos, em mais da metade dos casos de linfoma não-Hodgkin, de caráter agressivo, os pacientes conseguem obter a cura. “Por meio da quimio-imunoterapia, hoje a gente consegue curar, de forma geral, 75% dos pacientes com diagnóstico de linfoma difuso de grandes células. É claro que quanto mais precoce o diagnóstico, mais fácil o tratamento e maior ainda a chance de cura. Há situações em que a doença é diagnosticada em estágios mais avançados, onde mais regiões estão acometidas. Nestes casos, curabilidade da doença fica um pouco comprometida”, alerta Jorge Vaz.
“Diagnóstico precoce, em qualquer uma das doenças oncológicas, é um fator importante para poder contar com o tempo e com estratégias de tratamento que contemplam diversas opções”, reforça Breno Gusmão.
Segundo os médicos, quando o primeiro tratamento não dá certo e o paciente tem uma recaída, pode-se ser necessário o transplante de medula óssea. “Se houver uma recidiva, pode ser necessário uma modalidade de tratamento chamada transplante de medula óssea. Ele não é empregado logo de cara, é realizado para os pacientes que não responderam tão bem ao primeiro tratamento e tiveram um retorno da doença”, explica Ricardo Bigni.
Embora não sejam tão comuns quanto outros tipos de câncer, de acordo com os especialistas, os linfomas são frequentes no Brasil. “De uma forma simplificada, os linfomas são a sexta forma mais comum de câncer”, diz Ricardo.
Além de Jorge Aragão, outras personalidades também receberam o diagnóstico de linfoma não-Hodgkin, passaram pelo tratamento e alcançaram a cura, como é o caso da ex-presidente Dilma Rousseff, os atores Reynaldo Gianecchini e Edson Celulari, e a escritora Gloria Perez.
Diferença entre linfoma e leucemia
Embora ambas as doenças sejam cânceres hematológicos, a principal diferença da leucemia e dos linfomas é o local de origem. “As leucemias têm origem na própria medula óssea, que é a ‘fábrica do sangue’. Elas são um defeito no material genético da própria célula tronco, que é a célula mãe, que vai ser repassado para as células filhas, formando um clone anormal de células. O que separa principalmente as leucemias e os linfomas é a origem. Enquanto a dos linfomas são os gânglios linfáticos, a das leucemias é a medula óssea”, esclarece Jorge Vaz.
Agosto verde claro
Assim como o outubro rosa, mês de prevenção ao câncer de mama, e o novembro azul, de prevenção ao câncer de próstata, o mês de agosto recebeu a cor verde clara para se tornar o mês de conscientização e combate ao linfoma. Pensando nisto, a Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale) divulgou novos dados da jornada do paciente, pesquisa que busca entender os perfis e necessidades dos portadores desta doença.
Além de mostrar o desconhecimento dos principais sintomas e a demora para procurar um médico, os números também revelam a dificuldade de acesso para receber a confirmação do diagnóstico.
Entre os pacientes com linfoma de Hodgkin, aqueles que são autodeclarados pretos possuem mais dificuldade para fechar o diagnóstico (53%). Os que utilizam o Sistema Único de Saúde (SUS) também demoram mais para fechar o diagnóstico.
A pesquisa mostra também que pacientes passam por muitos médicos na atenção básica, o que gera um atraso no encaminhamento ao especialista. Além disto, a lei dos 30 dias, que determina que, caso haja uma suspeita de câncer, os exames para confirmar o diagnóstico devem ser realizados em até 30 dias, não foi respeitada em 74% dos casos. 20% dos pacientes enfrentaram falta de acesso a exames para fechar o diagnóstico e/ou para acompanhamento do tratamento.
Por outro lado, a lei dos 60, que garante ao paciente com câncer o direito de iniciar o tratamento no SUS em, no máximo, 60 dias após o diagnóstico da doença, foi respeitada em 86% dos casos.
Entre os pacientes com linfoma não-Hodgkin, 75% tiveram mudanças na rotina, sendo que 65% deixaram de trabalhar, 48% largaram a prática de atividades físicas e 40% abandonaram os relacionamentos sociais. Demora do paciente em buscar atendimento e no encaminhamento ao especialista, e dificuldade para realizar exames diagnósticos também foram observados nesta categoria. A lei dos 30 dias não foi respeitada em 65% dos casos.
Fonte: O Dia
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